sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Transtorno do Pânico

Descrito pela psiquiatria contemporânea oficialmente desde 1980, quando apareceu no Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (o DSM), o transtorno do pânico é também citado no Código Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (o CID-10), publicado pela Organização Mundial de Saúde.

O transtorno do pânico caracteriza-se por um período de intenso temor ou desconforto no qual quatro dos seguintes sintomas surgem abruptamente: palpitações ou ritmo cardíaco acelerado; sudorese; tremores ou abalos; sensação de falta de ar ou sufocamento; sensação de asfixia; dor ou desconforto torácico; náuseas ou desconforto abdominal; sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio; desrealização (sensação de irrealidade) ou despersonalização (estar distanciado de si mesmo); medo de perder o controle ou enlouquecer; medo de morrer; anestesia ou sensação de formigamento e calafrios ou ondas de calor.

O pânico é uma reação de ansiedade em relação a sensações do próprio corpo. Enquanto nas fobias a pessoa sente ansiedade em relação a um objeto externo, no pânico ela fica ansiosa frente ao que sente em seu próprio corpo. Esta é uma das características centrais do pânico: os perigos vêm de dentro, vêm do próprio corpo, numa sensação de grande angústia.

Os sintomas sugerem que o indivíduo está sob ameaça de algo terrível, do qual precisa fugir, embora não haja perigo concreto aparente. Em 1895, Freud descreveu a neurose de angústia nos mesmos moldes em que hoje é descrito o transtorno do pânico, com manifestações corporais e ataque de angústia, sem nenhuma representação psíquica, além de um sofrimento intenso. Freud assinala ser possível que o sujeito venha a recorrer “à interpretação que estiver mais à mão” (medo de morrer, loucura, crença no distúrbio de uma função corporal) como uma tentativa de configuração, de uma busca de explicação causal, que poderia reduzir sua angústia.

O transtorno do pânico pode parecer não possuir significado psicológico. Os ataques podem surgir “inesperadamente”, sem desencadeantes ambientais ou intrapsíquicos conhecidos. Por vezes a pessoa fala do pânico como algo totalmente alheio à sua experiência, à sua história, sem qualquer conexão com suas emoções ou com sua história de vida. Expressa-se como se tivesse uma virose ou sido contaminada por algo desconfortável, incômodo, estranho, alheio à sua pessoa.

Para a Psicanálise, entretanto, existe um sofrimento psíquico que precisa ser reconhecido, sobretudo pelo próprio paciente. É importante lembrar que Freud mostrou o desamparo como condição intrínseca do bebê humano ao lado da importância e da necessidade de um outro para que cada um de nós sobreviva e se desenvolva biológica e psiquicamente. Assim, o pânico corresponderia à angústia decorrente da percepção do desamparo e da impossibilidade de tolerar essa condição, algo sempre presente na experiência humana e não restrito aos tempos atuais.

Para o psicanalista, a tarefa seria levar o paciente a se envolver no seu sofrimento, a desenvolver interesse e curiosidade com o que acontece a si próprio, para que possa encontrar um significado nos seus sintomas.
Em geral os pacientes apresentam dificuldades frente à ameaça de perda de vínculos, intolerância às frustrações, dificuldade de pensar e conter seus estados emocionais, ao lado de fragilidade no senso de identidade pessoal e aspectos ligados à dependência.

O trabalho psicanalítico é uma experiência que pode auxiliar o desenvolvimento psíquico, expandir o mundo interno com maior participação de fantasias e de sentimentos. Assim, é possível que, ao longo do tempo, o paciente encontre outras formas de expressar e de lidar com seu sofrimento.

O objetivo do psicanalista é, então, despertar o interesse do paciente para seu próprio funcionamento psíquico, a partir de um encontro vivo entre duas pessoas que se comunicam. Por meio do acolhimento que ocorre nesta relação, espera-se que o paciente possa estabelecer vínculos mais consistentes consigo mesmo e com a vida.


*Norma Lottenberg Semer é psicanalista, membro associado da SBPSP, doutora em Saúde Mental e professora afiliada na UNIFESP. Psicoquê

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