Costumo imaginar que o consultório de
um terapeuta é como um verdadeiro jardim! Nele chega todo tipo de flor, planta
e arbusto, cada qual em uma fase diferente de desenvolvimento.
Algumas plantinhas são praticamente
recém-nascidas da terra, árvores pequeninas que por razões diversas já
encontram dificuldades em desenvolver troncos saudáveis e raízes fortes, para
assim seguir adiante crescendo.
Outras vêm em franca fase de florescimento,
árvores jovens e que deveriam estar cheias de vida e sonhos para frutificar,
mas que se sentem perdidas, frágeis e com medo do que aconteceria se seus
galhos começassem a crescer e ganhar altura. Temem, por exemplo, que suas
raízes sejam arrancadas do chão, ou que os galhos lhe pesem sobre o corpo, ou
ainda que os frutos ou flores que irão dar ao mundo não sejam belos, apetitosos
e apreciados por quem os veja ou os colha.
Algumas chegam em pleno outono,
depressivas pelas perdas das folhas, pelo clima gélido de seus corações, pelo
medo de não mais produzirem ou voltarem a florescer novamente. Entre essas, há
muitas árvores calejadas pela vida, que já passaram por muitas podas e já
serviram de abrigo para todo tipo de bichinho da natureza… cuidam de todos,
menos de si mesmas.
Aparecem também plantinhas
aparentemente frágeis, dessas que a gente nem entende bem como conseguem
resistir à climas áridos, aos ventos fortes e às tempestades. Mas, que pelo
poder da própria natureza sobrevivem bravamente e continuam persistindo
para encontrar a luz, a calmaria e a felicidade.
Vez ou outra, surgem algumas que
curiosamente desenvolveram seus galhos, mas esqueceram-se das raízes. Parecem
verdadeiras árvores flutuantes. Sonhadoras, elas estão sempre em busca de uma
nova aventura e ávidas por mudanças. Mas, por falta justamente de raízes que
nutram suas vidas, acabam não conseguindo se firmar ao chão e, com isso,
realmente se desenvolver. Correm o risco de nada realizarem e ficarem só na
imaginação.
E chegam tantas outras para serem
cuidadas, cada qual com sua especificidade, que não haveria palavras
suficientes para descrevê-las. Mas, entre tantas variedades, todas trazem algo
em comum: o desejo de se curarem, de se transformarem e desenvolverem-se em
todo seu potencial. E, para isso, entregam-se aos cuidados de um
jardineiro/terapeuta, confiantes de que ele saberá o que fazer para ajuda-las.
Neste encontro profundo, terapeuta e
paciente necessitarão confiar na natureza, compreender seu ritmo e seu
processo. Entender que mesmo os sintomas e os caminhos tortuosos que percorrem
os galhos e as raízes, são partes de uma tendência para se alcançar o
equilíbrio e a sustentação da vida.
Ambos terão que suportar todo tipo de
adversidade: as tempestades de sentimentos negativos; os momentos de seca em
que se farão presentes os silêncios e a diminuição do volume das águas da
expressividade emocional; as dores dos espinhos que crescem devido aos traumas;
as podas necessárias para que os padrões antigos deem espaço para o crescimento
e florescimento de novos comportamentos, as chuvas frequentes que encharcam o
terreno de lágrimas; e tantas outras variações que fazem parte dos ciclos da
natureza.
Mas, também viverão momentos de
profunda conexão e alegria! Neles sentirão em suas almas a chegada da primavera
e o florescimento de um novo Ser, mais pleno, forte, realizado e capaz de
cuidar-se e amar-se profundamente. Momento de contemplação, colheita e nova
semeadura, com a chegada das borboletas, das abelhas e dos passarinhos que
farão a polinização.
E assim, o terapeuta sente que seu
trabalho de jardineiro está concluído. E, com isso, se regozija por ter sido
expectador e testemunha de tão bela transformação!
Não podemos perder de vista que, para
cumprir sua tarefa, o jardineiro precisará, todos os dias, fazer do seu jardim,
um terreno fértil ao desenvolvimento de tudo que ali cresce. Precisará ir a
fundo no conhecimento da alma humana, assim como bom jardineiro é conhecedor de
todo tipo de vegetação.
Isso renderá longas horas de estudo,
muitas pós-graduações, horas de análise e supervisão. Também precisará de
“bagagem”, aperfeiçoando suas técnicas e ferramentas de trabalho, e
enriquecendo-se com as experiências de sua própria vida e com as vivências
trazidas pelas trocas com cada paciente que cruzar seu caminho. Tudo isso lhe
servirá como o adubo que fertiliza o solo e proporcionará os meios necessários
para garantir a nutrição e o desenvolvimento de tudo que nascer em seu jardim.
Na minha experiência como
terapeuta/jardineira tenho visto muitas árvores ganharem raízes fortes, galhos
frondosos, flores belíssimas e frutos saborosos. Assim, como vejo, a partir de
cada troca e relação, brotarem em meu próprio jardim interno novas raízes e
flores, que me tornam cada vez mais plena e mais humana.
Espero um dia, como todo terapeuta, que
as sementes espalhadas dêem uma linda floresta, onde tudo possa viver expansão
e equilíbrio. Pois ser jardineiro é também sonhar com um mundo onde cada
plantinha tenha seu espaço e seu valor!
Autora: Marela Bianco
Fonte: CONTIoutra
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