No exercício
profissional do psicólogo, principalmente os recém formados, uma das coisas que
mais causa desconforto é o silêncio do paciente. Pacientes que falam demais ou
que trazem dramas para dentro do setting muitas vezes são mais “fáceis” de
manejar do que aqueles que ficam ali, diante do profissional ou no divã
complemente em silêncio. Alguns soltam uma frase ou outra mas logo em seguida
voltam a silenciar.
Classicamente a
leitura é se tratar de uma resistência, resistência por parte do paciente em não
poder (como um imperativo categórico inconsciente) revelar coisa alguma, pois
isso o faria se deparar com seu desejo, e disso ele (e nós também) foge como o
diabo foge da cruz. Gostaria de acrescentar duas possibilidades de compreensão
do silêncio, como impossibilidade e como conquista, índice de saúde.
O silêncio da
impossibilidade compreendo a partir da concepção de fragilidade egóica, em que
o indivíduo, por conta de uma maternagem insuficiente, não pôde experienciar e
registrar os eventos ocorridos em determinada fase de seu processo de
amadurecimento. Neste caso o silêncio figura como a impossibilidade de dizer
qualquer coisa, pois de fato, não há nada a ser dito:
“O paciente
precisa ‘lembrar’ isto, mas não é possível lembrar algo que ainda não aconteceu,
e esta coisa do passado não aconteceu ainda, porque o paciente não estava lá
para que ela lhe acontecesse” (Winnicott, Medo do Colapso).
Agora o silêncio
como conquista figura como um dos índices de saúde do sujeito. O paciente fica
quieto como forma de não precisar dizer nada, poder ficar com si mesmo sem se
sentir obrigado a responder ou dizer qualquer coisa ao psicólogo. Esta
conquista se ampara no conceito de “capacidade de estar só”, uma conquista no
processo de maturação em que o indivíduo fica só na presença do outro, sua
existência assegurada pela presença do ambiente permitindo assim que
simplesmente não diga nada, algo como aquele lugar em que as crianças brincam,
sem dissociar da realidade mas também sem ficar o tempo todo verificando a
consistência do ambiente, lugar esse chamado de espaço potencial, lugar dos
fenômenos e objetos transicionais: “Em quase todos os nossos tratamentos
psicanalíticos há ocasiões em que a capacidade de estar só é importante para o
paciente.
Clinicamente isto
se pode representar por uma fase de silêncio, ou uma sessão silenciosa, e esse
silêncio, longe de ser evidência de resistência, representar uma conquista por
parte do paciente. Talvez tenha sido a primeira vez que o paciente tenha tido a
capacidade de realmente ficar só” (Winnicott, A capacidade para estar só).
Fonte: Academia Freudiana
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