O caso da mineira que traiu o marido
com seu melhor amigo deveria ser só mais um adultério a ser tratado entre
quatro paredes, no mais íntimo da vida conjugal do casal, mas acabou
viralizando na internet quando o marido traído filmou a cena e espalhou o vídeo nas redes
sociais. Na filmagem, ele – que flagrou a esposa saindo do motel com seu melhor amigo –
agride a esposa enquanto um outro amigo filma a cena e incita a briga.
O que choca na situação não é a desnecessária publicidade
de uma questão íntima: isso transformou-se em uma praxe mais natural do que
deveria na internet. As pessoas deturpam a finalidade das redes sociais quando
expõem-se desnecessariamente nas mais esdrúxulas situações.
O que me deixou realmente estupefata na mais nova
bizarrice das redes sociais é a naturalidade com que um homem, em pleno século
XXI – quando as discussões sobre violência contra a mulher estão a todo o vapor
– publiciza uma agressão física na rede sem nenhum tipo de represália.
O enfoque da viralização do vídeo não é a agressão
pública – física e verbal – sofrida pela mulher, exposta e agredida em plena
rede – mas a condenação moral pela traição – que, embora reprovável, não diz
respeito a ninguém mais além dos envolvidos. A agressão, ao contrário, é
recebida como natural, uma reação justa e proporcional ao adultério.
As pessoas estão tão preocupadas em julgar a vida íntima
alheia que não se dão conta do quão absurdo é agredir uma mulher e levar isso a
público sem medo das conseqüências.
Acaso um homem fosse flagrado saindo de um motel com a
melhor amiga de sua esposa, este seria apenas mais um dia comum na internet. A
indignação, caso houvesse, certamente se concentraria na amiga que “deu em cima
de um homem comprometido”, ou na esposa omissa que foi traída porque “não dá
conta de segurar um homem” – jamais na figura do pobre homem adúltero. Afinal,
a carne é fraca e os ‘instintos masculinos’ justificam a traição.
Mas quando uma mulher é flagrada traindo seu marido, a
moralidade seletiva impera de tal forma que até mesmo a violência física
escancarada nas redes sociais é ignorada diante do ‘absurdo’ do adultério.
As pessoas respeitam a vida íntima do outro quando ouvem
um vizinho agredindo sua esposa (não vou chamar a polícia, eles que se
resolvam!), quando assistem a um relacionamento abusivo (só ela pode se livrar
do marido opressor!) – mas quando presenciam o ‘erro’ de uma mulher,
esquecem-se da sagrada intimidade conjugal e julgam-na nas redes sociais.
Este é o retrato da hipocrisia moderna: a vida sexual do
outro indigna, a violência não. O que esperamos de uma sociedade tão moralista
é que empenhe toda esta retidão para meter a colher nos relacionamentos
agressivos e opressores, mas a moralidade do patriarcado só se aplica à mulher.
Não estamos aqui para determinar se traição é ou não
reprovável – por mais natural que seja escancarar a própria vida na internet,
não podemos nos quedar diante desta realidade: a vida sexual do outro não nos
diz respeito. A violência, sim.
Escrito
por Nathalí Macedo
Fonte:
DCM
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